quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Sem Alicerce a Casa Cai

Estou na Índia a trabalho nessa semana. Minha decepção só não foi maior porque já tinha ouvido muitas pessoas falarem experiências nada agradáveis do país.

Imagine-se numa grande favela de uma cidade qualquer do Brasil. Agora coloque prédios gigantes e vistosos no meio da favela. Aumente e asfalte umas 2 ou três ruas principais - o resto deixe tudo como está. Adicione agora muitos carros e motos, buzinando o tempo todo. Adicione então vacas, muitas vacas, sendo algumas ordenhadas no meio da rua. Se você não pensou em uma favela muito suja, jogue algumas toneladas de lixo pelas ruas. Coloque agora pessoas cultas e com dinheiro no meio da favela e torne os todos os outros habitantes calmos e educados. Como último toque, faça-os falar um português que praticamente ninguém em portugal consiga entender direito.

Pronto! Agora você consegue ter uma idéia real do que é a Índia.

Embora nunca tivesse vindo pra cá, já trabalho com indianos há um bom tempo, e falo quase que semanalmente com pessoas daqui. Por experiência própria, afirmo sem medo de errar que existe muita gente boa e capacitada, com excelentes idéias e habilidades. Até então, antes de pisar aqui, acreditava piamente que o país seria uma das maiores potências do mundo logo, logo.

O que vi entretanto, me lembrou muito das preocupações que tenho com o Brasil: nosso país nunca será um país de primeiro mundo se não resolver o problema da violência, que impede que bares abram de noite, que por sua vez impede que pessoas circulem à noite, que por sua vez não aquece o mercado, que por sua vez traz menos investidores, que por sua vez... Sim, é uma bola de neve.

Na Índia, não existe uma violência nem parecida com a do Brasil. O problema é a falta de vontade política de criar as bases para o desenvolvimento. Segundo os próprios moradores, os políticos estão fazendo o que lhes dá dinheiro mais fácil (trazer empresas para o país) e esquecendo de cuidados básicos com o povo. Embora tenham segurança, não dão as condições mínimas de infraestrutura. A falta de cuidado com a limpeza e as estradas (incluindo um lugar para as pessoas caminhar fora das faixas) faz com que as pessoas demorem quase 2 horas para chegar ao trabalho, que faz com que as pessoas queiram sair mais tarde pela manhã, que faz com que lojas comecem abrir as 11 horas da manhã, que assusta muitos investidores, pois precisam enfrentar isso todas as vezes que têm que visitar as instalações do seu call-center (já ouvi mais de um empresário falar que tem idéia de tirar o time que contratou do país somente pela incomodação que causa para ele: "prefiro reduzir meus lucros e não me estressar tanto cada vez que viajo").

Como se não bastasse, outras coisas que o mundo ocidental considera básico, como condições pessoais de higiene e uma comida que não queime a boca nem cause congestão depois de dois dias seguidos, são coisas nada comuns. O ocidental se sente completamente perdido no país.

Atrair investimentos foi uma grande jogado do governo - um golpe de mestre (e, é claro, uma grande forma dos políticos encher os próprios bolsos) . Mas o mesmo governo esqueceu ou simplesmente não teve vontade de cuidar da base para que isso ocorra. Sair de onde está agora exigirá um grande planejamento e provavelmente uma redução proposital de crescimento para possibilitar a criação dos alicerces. Sem ela, a casa pode desmoronar em pouco tempo.

Fico imaginando se a Índia tivesse a infraestrutura do Brasil. Certamente já seria uma potência muito maior do que é hoje.

Imagine então o Brasil com um plano de desaceleração proposital durante um período para arrumar o problema da segurança e a vontade política que o governo indiano tem de atrair investidores para o pais, com subsídio de longo prazo para cursos de inglês para as classes C e D, por exemplo. Não teria pra ninguém.

Infelizmente, enquanto nossos políticos forem financiados e financiarem a criminalidade, estaremos no mesmo lugar, no mesmo buraco, vendo a banda passar, sendo sempre o país do futuro - nunca do presente.

Dr. Zambol
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