segunda-feira, 6 de julho de 2009

O mundo é plano para todos

A visão Friedmaniana de que o mundo é plano a maioria de nós já conhece. Mas o quanto esse plano se inclina para o leste ainda é algo que não apreciamos totalmente. Quando sairmos lá do outro lado dessa crise é que veremos de fato.

Hoje de manhã eu fui buscar a minha bicicleta nova na loja. Aqui na Irlanda (como em quase toda a Europa) o governo incentiva as pessoas a usarem bicicleta como meio de transporte, então eu pude trocar a minha antiga magrela por uma novinha em folha pagando menos da metade do preço. O modelo escolhido dessa vez foi uma Merida Speeder T2 reluzindo. Nunca ouviu falar de uma bicicleta Merida? Pois vá se acostumando. A Merida é uma companhia Taiwanesa que no passado fabricava o quadro de algumas das melhores bicicletas do mundo. Acontece que nos últimos anos ela resolveu lançar seus próprios modelos, e o resultado são bicicletas de grande qualidade a um preço extremamente competitivo. A empresa cresceu a tal ponto de tornar-se dona de 49% das ações da americana Specialized (ah, essa você conhece...).

Que a maioria dos produtos manufaturados que consumimos hoje em dia têm sua origem na Ásia nós já sabemos. A corrida por redução de custos nas últimas décadas levou indústrias inteiras a converterem-se ao movimento Outsourcing / Offshoring Friedmaniano. De computadores a bicicletas, as maiores marcas hoje em dia não são muito mais do que marcas - o produto em si vem do leste. Você é 'cool' e tem um iPhone? Joga Wii ou PS3 com seus amigos? Lê esse post da Tribo em um laptop HP ou Dell? Está interessado em comprar um Kindle da Amazon? Pois saiba que todos esses produtos, todinhos, são fabricados por uma única empresa Taiwanesa - a Hon Hai Co., mais conhecida como Foxconn. Se você não sabia, agora ficou sabendo.

Só que esse é só o começo da história. Essa é a parte fácil, que o Thomas Friedman e todo mundo enxergou anos atrás. OEMs, ODMs, massificação da produção de produtos, redução de custos causada pelo ganho de escala. O que ninguém tinha prestado atenção era nas Meridas da vida. As empresas asiáticas, cansadas de serem pressionadas pelos grandes clientes (marcas) para manterem seus custos absurdamente baixos, e também cansadas dos efeitos que os períodos de crise causam a elas por serem tão dependentes de seus clientes, começaram a colocar suas manguinhas de fora. A Merida que mencionei antes é um exemplo, mas existem outros. Você a essa altura já deve ter ouvido falar em celulares HTC, certo? Trata-se de mais uma companhia Taiwanesa que costumava fabricar aparelhos de celular para as maiores marcas por aí, até que se encheu dessa vida e resolveu vender seus próprios modelos. Tem crescido absurdamente nos últimos anos. Outro exemplo: Acer. Costumava ser uma humilde fabricante de computadores para grandes marcas americanas. Desde 2000 ela deixou a operação de OEM/ODM com sua irmã-gêmea Wistron e lançou-se a vender seus próprios modelos. Hoje é a 3a maior fabricante de PCs do mundo, no calcanhar da Dell (será certamente a número 2 do mundo, nos calcanhares da HP até o final de 2009).

Outros exemplos não faltam: Asus, BenQ, etc. Todas empresas asiáticas que foram procuradas por grandes conglomerados para assumir a manufatura de produtos nas últimas décadas, e agora estão voltando para competir de igual para igual com seus antigos (na verdade atuais) clientes. Será o início do fim dos modelos atuais de offshoring/outsourcing? De onde é mais fácil surgir a inovação? Não será onde os produtos são desenhados e produzidos? O conceito de Netbook veio da Ásia...

Veremos o que restará do outro lado da crise, mas tem muita empresa 'de marca' que vai sofrer com a concorrência dos antigos fornecedores do leste. Fazer o quê, o mundo é plano. E é plano para todos os lados.

Reggie, the Engineer (João Reginatto)
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