segunda-feira, 8 de março de 2010

A Bruxa (Reedição)


O dia da Bruxa começava sempre igual. Chegava ao trabalho precisamente às 7h45min. Gostava de chegar cedo, chegar antes dos outros. Sentava, lia os e-mails e ficava esperando o resto do pessoal chegar. Por volta das 8h30min o movimento já era intenso no escritório. Então ela saía para fazer a ronda. Caneca de café na mão, presente da sobrinha, cheia. Sem açúcar, é claro, quem gosta de café docinho é a vovozinha.

A Bruxa ganhara o apelido por conta das suas posições fortes e por um profissionalismo ferrenho, digno de lembrança pelos chefes e ódio por colegas. Com relação aos subordinados as opiniões eram divididas. Alguns não suportavam o seu estilo, mas os que gostavam não trocavam por nada. Diziam:
- A Bruxa é o que é. Dura, às vezes fria, mas transparente. Quer algo melhor que isso? 
E era terrivelmente eficiente, conhecia o seu negócio como ninguém. A verdade é que a maioria dos seus detratores era formada por incompetentes que cruzavam o seu caminho. Com esses tinha pouca paciência mesmo. Em reuniões a coisa era mais ou menos assim:
- E então o projeto está correndo de acordo com o cronograma, exceto o relatório do departamento X que ainda não recebemos.
Sinal de Alerta, o departamento X era o seu departamento. As sobrancelhas se eriçaram por detrás dos óculos, que mais serviam de charme, dando-lhe um ar de professora universitária. A bruxa enxergava e ouvia muito bem. E a menção do seu departamento a fez voltar para a entediante reunião e deixar o trabalho infinitamente mais produtivo de responder e-mails para trás.
- Hrmm, hrmm. Raul?
Raul sentiu o nó da gravata apertando no pescoço. Acabara de se arrepender por cruzar o caminho da Bruxa.
- Por acaso, você está se referindo ao relatório de rentabilidade das franquias?
- Sim, esse mesmo.
- Engraçado, eu enviei para você esse relatório no último dia 18, exatamente a uma semana atrás. Entregamos na data, mesmo depois de você mudar de idéia duas vezes sobre as informações que precisava.
O filete de suor correu pela testa de Raul. Tentava não gaguejar na resposta.
- Hmm, estranho, não recebi. Devo estar com um problema no meu e-mail. Vou reclamar para o pessoal de TI.
- Pode ser... De qualquer maneira eu continuo recebendo sua lista de piadas sobre loiras diariamente. Deve ser algum problema no nosso firewall, de qualquer jeito estou enviando novamente.
Era fato, ninguém ganhava da bruxa. 

O mundo corporativo não tem muito apreço por mulheres duras e eficientes. É certamente mais complacente com os homens assim. A sociedade espera que uma mulher se comporte como mãe e os estereótipos são normalmente extensíveis ao ambiente de trabalho. Em um cenário tão competitivo a diversidade é um diferencial para as empresas. E diversidade se constrói com bruxas, e também fadas. É importante lembrar isso, especialmente no dia internacional da mulher (08/Mar). Parabéns a todas as nossas leitoras.

[]s
Jack DelaVega