quarta-feira, 10 de junho de 2009

Paraninfo

Roberto nada fez depois de ouvir o seu nome, foi apenas depois do cutucão do colega que voltou a si e encaminhou-se para o palco. Os passos até o microfone foram tortuosos. Subiu ao pódio, olhou para a platéia, os formandos, limpou a garganta e começou. Era um grande orador, daqueles que nos prende atenção na conversa do cafezinho. Talvez por isso fosse difícil para o grande público, para aqueles que não o conheciam, perceber que estava alterado em função de uma combinação explosiva de álcool com anti-depressivos.

- Excelentíssimo Sr. Reitor, Ilustríssimo Diretor do curso, pais, amigos, meus afilhados.
Ele iniciou, olhando nos olhos de cada um dos formandos.
- Blah, blah, blah. Já repararam como existem Excelentíssimos e Ilustríssimos em discursos de formatura?
Risos.
- É Verdade. Mas na vida real dificilmente encontrei gente assim, gente que mereça esse tipo de tratamento.
Prosseguiu enfático:
- Meus afilhados, eu queria lhes passar hoje, no dia de suas formaturas, uma mensagem positiva, uma mensagem de conforto e esperança. Queria, mas não posso.
Fez uma parada, como se revisasse mentalmente sua decisão de seguir adiante. Mas continuou:
- É meu dever, meu dever como Mestre, como Educador, prepará-los para a vida. E a vida é dura. O mundo profissional não é um mar de rosas, especialmente quando comparado com suas vidas até hoje dentro da academia. Lá fora, não se joga limpo. Não se iludam, o mundo empresarial vai querer o máximo de vocês, mas oferecerá muito pouco em troca. Vocês serão testados ao extremo, sua ética será testada ao extremo. Primeiramente, nas pequenas coisas, mas logo, logo, o preço irá aumentar. E não existe o caminho do meio nesse caso. Não existe meia ética. Um simples passo fora dessa estrada pode levar a perdição.
Tomou fôlego e continuou:
- Também tenho o dever de avisá-los, tomem cuidado com as pessoas de sucesso. Definir o sucesso pessoal em função do que a sociedade espera de você é fácil, e perigoso. Não deixem que isso aconteça. O carro do ano, a viagem à Europa, os ternos italianos e as gravatas de seda, só fazem sentido dentro de um contexto maior.  A única, repito, a única pessoa que tem o direito de definir o seu próprio sucesso é você mesmo. Já conheci grandes executivos que dariam tudo por uma segunda chance com seus familiares. E auxiliares de faxina que não mudariam as suas vidas por nada desse mundo. Parece exagero, mas não é. Infelizmente, só o tempo vai mostrar o valor de cada escolha. Mas tenho o dever de alertá-los para isso.
A vista escureceu, tonteou, mas recobrou as forças para as últimas palavras:
- E, mais importante do que tudo, lembrem-se do que eu vou falar agora, a sua felicidade depende disso! Não se esqueçam, em hipótese alguma que...
Blam!
Desmaiou diante de toda a platéia, antes que conseguisse terminar o discurso. Foi socorrido sem saber se havia atingido o seu objetivo, mas, certamente, aquelas palavras ficariam gravadas para sempre na memória dos seus afilhados.

[]s
Jack DelaVega