sexta-feira, 4 de abril de 2008

Quero me Mudar para o Exterior

Quando você se muda para o exterior, vira automaticamente referência para quem quer fazer o mesmo. Impressionante a quantidade de pessoas que já me contactaram desde que me mudei, tentando obter dicas e conselhos. Semana passada mesmo chegou aqui um rapaz do Brasil que eu nunca havia conhecido pessoalmente, mas que ajudei a avaliar algumas opções na Europa. Esse final de semana chega uma menina que também pediu dicas recentemente. Fora os outros que ainda não chegaram mas que pelo andamento das coisas não tardam.

A maioria pergunta inicialmente: como você conseguiu? Como se mudar-se para o exterior fosse uma coisa simples de se conseguir, desde que você tenha as “barbadas”. Mais ou menos como comprar um ingresso para um show esgotado (“como você conseguiu??”). Ora, eu vinha planejando isso desde 2003, o que incluiu uma tentativa frustrada. E não acho que tenha conseguido alguma coisa. Estou apenas no meio do trajeto.

Então resolvi escrever um pouco sobre o que está envolvido em um processo de mudança para o exterior, ou “relocation”, que é o termo usado no meio profissional.

O primeiro ponto, e mais importante, é entender por que você quer mudar-se para fora do Brasil. Como eu falei, essa mudança não deve ser encarada como um objetivo final. Ela deveria fazer parte de um objetivo maior, de um plano que você estabeleceu para o seu desenvolvimento pessoal ou profissional. Qualquer coisa fora disso é risco alto de insucesso. Ouço gente falar que gostaria de mudar-se para fugir da insegurança instalada no Brasil. Outros querem mudar-se para ganhar dinheiro. Pra mim, isso tudo é besteira. São argumentos para disfarçar a real razão: os outros estão fazendo, então eu também quero. Novamente usando a idéia de projeto que já mencionei no passado para planejamento de carreira, uma mudança para o exterior deve ter um início, resultados esperados , e um critério claro de encerramento (não que você deva voltar, mas que você consiga dizer “OK, atingi o que queria”).

O segundo ponto importante é preparação. O Diabo mora nos detalhes, então o destino no exterior deve ser muito bem escolhido. Tenha certeza de por que você está escolhendo ir para os Estados Unidos ao invés do Canadá. Ou por que você preferiu a Irlanda à Inglaterra. Não existe coisa mais fantástica do que as peculiaridades de cada capital ou cidade do interior européia, ou ainda das diferenças entre a costa oeste e costa leste dos Estados Unidos. Portanto decidir-se por um lugar em detrimento do outro é uma coisa extremamente subjetiva. Mais ainda se você não conhece os lugares. Ouço gente dizer que nunca moraria na Escócia porque “o clima é horrível”. Ou que nunca mudaria-se para a Espanha porque “o povo é muito preconceituoso contra sul-americanos”. Ou ainda que não moraria nos Estados Unidos porque “é um pais de ignorantes”. Da mesma forma, já ouvi gente dizendo que estava indo para a Polônia pois o “mercado lá está aquecido”. Ora, qualquer um com um pouco de cérebro e bom senso sabe que essas são generalizações estúpidas. Ler um pouco de jornal e estudar um pouco de geografia e história ajuda bastante e não faz mal a ninguém. Eu sou fã de um trecho do livro Mar Sem Fim, do Amyr Klink, que diz: "... Hoje entendo bem meu pai. Um homem precisa viajar. Por sua conta, não por meio de histórias, imagens, livros ou TV. Precisa viajar por si, com seus olhos e pés, para entender o que é seu. Para um dia plantar as suas próprias árvores e dar-lhes valor. Conhecer o frio para desfrutar do calor. E o oposto. Sentir a distância e o desabrigo para estar bem sob o próprio teto. Um homem precisa viajar para lugares que não conhece para quebrar essa arrogância que nos faz ver o mundo como o imaginamos, e não simplesmente como é ou pode ser; que nos faz professores e doutores do que não vimos, quando deveríamos ser alunos, e simplesmente ir ver". Portanto, uma dica: não siga nem mesmo os meus conselhos sobre para onde ir. Defina o seu destino.

Por último, queria salientar que não é fácil morar no exterior. Já conversei com diversas pessoas que passaram por essa situação e os estágios são basicamente os mesmos. No início tudo é alegria, tudo é deslumbramento. Essa fase dura de 1 a 2 meses e ajuda a superar as dificuldades iniciais. Depois vem a fase da saudade, que dura mais 1 ou 2 meses. Nessa fase o Brasil parece ser o melhor país do mundo, pois as lembranças das coisas ruins já se foram e só fica a saudade da família, dos amigos, da rotina. Essa fase acentua-se pelo fenômeno que eu chamo de “invisibilidade”. Durante um período no exterior, você torna-se invisível do ponto de vista social. Você não existe. O que fazer no final de semana? Com quem conviver no seu tempo livre a não ser seus familiares? Quem tem amigos brasileiros por perto cria o famoso “gueto” e com isso costuma enganar essa fase. Mas o fato é que a maior dificuldade para quem muda-se para o exterior é inserir-se efetivamente como membro da sociedade, fazendo parte de grupos, tendo atividades extra-profissionais, etc. Depois de uns 6 meses trabalhando para atingir um patamar melhor nesse sentido, tudo começa a melhorar. E daí vem a fase onde realmente se aproveita a experiência.

Bom, essa é obviamente a minha visão, que pode ser míope. Eu apenas queria deixar claro que mudar-se para o exterior não é um mar de rosas como parece. Exige muito planejamento, dedicação e principalmente uma idéia clara do que se deseja atingir. Qualquer coisa fora disso provavelmente não passa de uma aventura. Mas e aí, eu indicaria isso para os outros? Um milhão de vezes sim. A recompensa pessoal e profissional após todo esse esforço é grande demais para explicar em um post.

Reggie, the Engineer.
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