terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

Quarta-feira, 8:30 - Entrevista de Emprego

O anúncio pedia por um programador experiente para trabalhar em um projeto de Internet. Não custava tentar. A Itália não é exatamente um pólo de tecnologia da informação, então um anúncio desses não podia ser descartado.

A conversa por telefone foi breve, praticamente abrupta. Um senhor de idade do outro lado da linha, voz rouca carregada - certamente resultado de anos de tabagismo, falava rapidamente em inglês com sotaque carregadíssimo. Pediu para que eu estivesse às 8:30 da manhã do dia seguinte na estação Rebibbia, final da linha azul da Metropolitana de Roma. Dali ele me pegaria de carro e seguiríamos para o escritório para conversarmos.

No dia seguinte, saí de Ostia antes das 7:30 da manhã. Depois de quase uma hora de trem e metrô, cheguei na tal estação, ainda com tempo para caminhar um pouco e tomar um café. Às 8:35 o celular toca, e em seguida encontro este senhor alto, gordo, com chapéu de Indiana Jones e óculos escuros. Ele me pede um minuto e diz que temos que esperar um outro funcionário seu que também chegará naquela estação. Com seu inglês macarrônico, conversamos sobre amenidades. Em menos de 5 minutos aparece o tal funcionário, um rapaz provavelmente mais novo do que eu, com cara de quem fez festa até altas horas da noite anterior.

Caminhamos até o carro, que está estacionado em fila dupla na movimentada avenida que circunda a estação. Uma BMW SW, aparentemente nova, mas muito mal cuidada. "Italianos..." eu penso comigo mesmo. Entramos no carro e partimos. O senhor me avisa que precisamos ainda pegar um segundo funcionário em uma outra estação de trem. Em seguida, toca o celular do italiano gordo, que mal parece caber no assento do motorista, e ele inicia uma desatinada discussão aos gritos. Fala tão rápido que não entendo nada, mas o seu funcionário sentado no banco traseiro dá risada. Eu preocupado com o trânsito e as manobras perigosas que ele insiste em desempenhar. Após desligar o telefone me avisa que seu outro funcionário está em outra estação e que agora terá que dar uma volta para pegá-lo.

Finalmente chegamos ao lugar onde o funcionário estava, e a única maneira que posso descrever esse cara é um hippie, uma espécie de Patropi italiano. Ele entra no carro fumando. O velho gordo, entre outras coisas grita com ele algo como "Que cheiro é esse? Você está fumando maconha no meu carro? Apaga essa m...!!!". Todos riem muito. E eu pensando, pôrra, onde é que fui me meter.

Depois de um longo período na estrada, chegamos ao "escritório", que na verdade é a casa do velho gordo. Um lugar muito bonito, perto de Guidonia, a nordeste de Roma. A vista das montanhas e o pequeno vilarejo são agradáveis aos meus olhos. Ele bate na porta e a sua secretária em seguida nos dá boas-vindas. Uma loira bonita, com seios volumosos, batom vermelhíssimo, uma Marilyn dos tempos modernos. E a ficha então começa a cair.

Eu subo com o velho para a sua sala, e ele me explica que é dono de 4 sites de conteúdo "adulto", líderes de mercado no país. Precisa de alguém para re-implementar o seu sistema de cobrança e interface com operadoras de cartão de crédito. O escritório era aquele ali, o salário era X, e o material é da "maior qualidade", diz ele com a cara mais cafajeste do mundo. Eu agradeço e apenas digo que não era exatamente o que eu estava esperando. Ele entende imediatamente e diz que caso eu mude de idéia, basta ligar para ele. Não conversamos sobre o meu currículo, não falamos de tecnicidades, nada. Na saída eu me despeço dos meus dois "quase colegas", que já estão firme na edição do material do dia. Coisa de primeira. A secretária me dá tchau com um risinho no canto da boca, e meia-hora depois eu já estou de volta no trem, dando gargalhadas sozinho, me lembrando de cada momento daquela "entrevista" de emprego.

Quando a coisa parece ruim, tenha uma certeza: sempre pode piorar.

Reggie, the Engineer.
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