quinta-feira, 24 de setembro de 2009

Humilhação e Impotência

Esse sábado estava assistindo ao filme Kung Fu Panda com a Dr. Zamba e dois amigos de longa data. Estávamos lá, reclinados no sofá, mais falando e gargalhando do que na verdade assistindo o filme. Já faz algum tempo que valorizo e muito esse tipo de encontro. Aqueles amigos que ali estavam nos conheciam há pelo menos 15 anos, e creio que você tem ciência que esse tipo de amizade não é nada fácil de encontrar. Depois do nascimento do meu filho então, agora com 4 meses e meio, o sentimento de ligação com familia e amigos ficou ainda maior.

Talvez por essa razão que tenha desistido completamente da idéia de me mudar para o exterior há um ano atrás, algo muitíssimo presente em minha vida e que por alguns pequenos detalhes não se concretizou. A decisão foi consciente - queremos pelo menos uns 3 anos ficar perto da familia e dos amigos.

De repente ouvimos alguns fogos de artifício. Era um barulho bem alto.

- Deve ser dos grande. Será que alguém fez gol? Indagou minha amiga.

Mas o barulho não parava, e parecia tornar-se cada vez mais forte e mais cadenciado. Foi quando nos demos conta que estávamos do lado de um tiroteio. Pelo barulho, pude perceber que havia 3 tipos de arma. Não sei se era uma .22, uma .38 e uma .45 ou uma 9mm, uma .44 e uma calibre 12. Não sou especialista e nem entendo de armas para conseguir identificar tal coisa. Só sei que eram três armas de calibres bem distintos pelo ruído gerado no disparo.

Meu filho estava dormindo no quarto de cima. Subimos a escada rapidamente, o pegamos no colo e ficamos os 5 deitados no chão. Depois de uns 40 disparos, aparentemente há um momento de sossego. BUM, BUM. Dois tiros a mais - e do calibre grande. Silêncio novamente...Talvez o criminoso com o maior calibre tenha matado os outros. Ou morreu. Ou matou os policiais que ali estavam. Havia policiais? A confusão mental era grande em minha cabeça.

Nunca havia presenciado um tiroteio que não fosse pela TV. Na verdade nem dessa vez presenciei, pois não vi nada. Fiquei ali no chão, abraçado com meu filho, sentindo um sentimento de impotência e humilhação, que há muito não sentia.

Não preciso dizer que não vimos o filme. O casal que lá estava ficou esperando mais algumas horas em minha casa, para ter certeza que realmente tudo tinha acabado, para então retornar à sua casa.

Não preciso dizer também que no dia seguinte começamos a pensar novamente em planos para o exterior - talvez só pelo resquício de medo do dia anterior, talvez só pelo sentimento de humilhação - mas começamos a pesar novamente o que vale mais: segurança nossa e do nosso filho ou a presença de amigos e familia? É uma decisão muito difícil de ser tomada e que não há uma resposta correta.

Acho simplesmente ridículo a insegurança do Brasil, que certamente não traz prejuízos apenas para as familias, mas para o comércio como um todo. Por que a vida noturna nas grandes cidades do Brasil limita-se a boates e Shoppings? As ruas à noite às vezes estão desertas - ninguém quer arriscar. Para abrir uma lojinha - nem que seja de brinquedos - o empresário terá que se preocupar (e pagar) muito para ter uma sensação irreal de segurança - pois a segurança real só pode ser provida pelo estado.

Mesmo assim, o movimento é no sentido oposto. Há não muito tempo atrás via sempre a polícia militar (PM) no meu trajeto diário. A presença da PM não só aumentava a sensação de segurança, como aumentava a segurança em si. Foi então que algum néscio do governo decidiu que deveria arrecadar mais se tirasse os PMs da função de salva-guardar o trânsito e criou a figura do guarda municipal de trânsito, conhecido aqui no sul como "azulzinho". O movimento foi simplesmente arrebatador. Contrataram-se centenas e centenas de azulzinhos, sem poder de prisão mas com muita vontade de multar.

O resultado foi a diminuição relativa do orçamento da PM. Se ao invés de criar a figura do guarda municipal de trânsito transferissem o dinheiro para a PM, talvez naquele dia não estivesse deitado no chão abraçado com meu filho. Mas não. Fomos na contramão mundial da unificação de polícias para a criação de mais uma polícia sem nenhum poder de segurança.

A segurança é uma das bases da sociedade, um direito pelo qual você paga mais de 4 meses de seu salário por ano de imposto para tê-la presente. Lendo os excelentes textos do meu amigo Reggie sobre empreendedorismo, me pergunto se podemos ser um chamariz de investimentos sem essa base - se realemnte podemos ser um país de primeiro mundo sem antes arrumar a casa nesse sentido.

Se o Brasil é realmente o país do futuro, nunca chegaremos a esse futuro com governantes como nosso excelentíssimo Sarney ou com idéias arrecadatórias na contramão do mundo e muito menos sem um investimento sério e focado na segurança.

Se você acha que esse não é um problema seu, lembre-se que essas questões são sempre avaliadas na hora de se criar uma nova sede de uma multinacional. Cria-se aqui ou cria-se no Chile onde podemos viajar mais seguros? E tenha certeza que são os empreendedores, os investidores internacionais e as grandes empresas multinacionais que devem estar pagando seu salário - direta ou indiretamente. A não ser que você seja um azulzinho ou trabalhe no senado, é claro.

- - Humilhação e Impotência - -

Dr. Zambol
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