quarta-feira, 17 de setembro de 2008

Reedição: O Mundo Quase de Graça

Dia 25 de fevereiro saiu na Wired um artigo sensacional de Chris Anderson (autor de A Cauda Longa). Ele fala sobre porque o futuro dos negócios é "de graça". Estou me referindo ao artigo Free! Why $0.00 Is the Future of Business. Gostaria de falar sobre esse modelo de negócio aqui na Tribo do Mouse.

Vamos iniciar com a historinha...

Joãozinho decide abrir uma empresa. Infelizmente, ele não tem muito dinheiro, só idéias. A primeira coisa que ele precisa é de um domínio. Com um desembolso de 10 dólares ele sai com seu domínio "www.joaozinhoApps.com" registrado. Se quisesse um ".info", ele conseguiria por 3 dólares na GoDaddy.

Agora Joãozinho precisa criar a página principal de sua empresa.

Com o Google Sites, de graça, ele tem uma infraestrutura que armazena até 10Gb em documentos e páginas e, de lambuja, consegue criar a Intranet da empresa também, onde poderá compartilhar documentos, vídeos e outras coisas com seus futuros empregados.

Joãozinho contrata seu gerente de desenvolvimento, o Pedrinho, e um desenvolvedor Java, o Roberto. Ele precisa de um e-mail para eles, o que consegue sem nenhum custo usando o Google Apps. Com essa simples "aquisição" ele ganha:
  • Contas de e-mail para seus 2 novos funcionários e para todos os outros novos que vierem. As contas são todas nome@joaozinhoapps.com, que torna visual bem profissional, e possuem 25Gb de armazenamento.
  • Word, Excel e PowerPoint on-line, com controle de versão para compartilhar com todos os seus funcionários.

  • Chat para comunicar com qualquer pessoa.

  • Um calendário estilo "Outlook", on-line, para agendar reuniões e outras tarefas. Os avisos podem ser enviados via SMS.

Desembolso até o momento (fora funcionários): 10 dólares.

Mas o problema ainda está por vir. Joãozinho precisa agora desenvolver seu produto: um aplicativo Windows para gerenciamento de despesas. "Sei que posso bater o Money da Microsoft com um bom produto e um bom marketing", pensa ele sempre.

Em uma reunião, Pedrinho, seu novo gerente, fala sobre oDesk. oDesk é um site de outsourcing. Programadores do mundo inteiro se cadastram lá e cobram por hora trabalhada. Compradores podem submeter projetos e contratar o serviço das pessoas. oDesk é tão bom que a hora trabalhada é a hora trabalhada mesmo. Para que um programador se cadastre lá, ele precisa instalar uma Webcam e ter o software da oDesk instalado em seu computador local, que tira um snapshop da tela e uma foto da Webcam de tempos em tempos. Se o programador for no banheiro, ele precisa parar o relógio. Isso faz com que as horas pagas sejam realmente horas trabalhadas.

Joãozinho acha muito boa idéia, mas ainda acha 20 dólares a hora um pouco caro, já que prevê em torno de duas mil horas de programação. É aí que Roberto, fala para ele:

- Eu estou cadastrado lá, pois preciso de dinheiro extra e trabalho no oDesk à noite. No início, mantive meu preço lá como US$0,01/hora. Como a única forma de ser escolhido em projetos grandes e que pagam bem é a gente já ter várias horas trabalhadas, tem muita gente boa que faz isso para aumentar o seu escore. Porque não tenta montar um time só com essas pessoas?

Joãozinho então faz uma busca no oDesk e encontra 165 profissinais cobrando menos do que 1 dólar a hora - sendo que a grande maioria dos 165 não cobra nada.

- Mas é muito arriscado, pode dar problema, não sabemos quem eles são, lembra Joãozinho.
- Então contrata diversos testers de graça também...

Convencido, Joãozinho faz isso. Demite Pedrinho, seu recém-contratado gerente e contrata, pelo oDesk, um gerente de projetos bastante experiente, por 30 dólares a hora. Cabe ao gerente de projetos contratar o time no oDesk (com o preço especificado) e lhe entregar o produto funcionando.

Algum tempo depois, pagando apenas 4 mil dólares para seu gerente de projeto (Dev e Teste saíram de graça), o produto está pronto.

Joãozinho então coloca o produto no mercado e as vendas começam a acontecer. Logo, ele percebe que precisa de uma ferramenta de CRM. Roberto lhe chama a atenção:

- O Zoho pode resolver o seu problema, de graça!

Quando Joãozinho se cadastra no site, fica abismado: não só tem uma ferramente de CRM pronta para ele usar, como também pode utilizar banco de dados, Wiki, Web Conferencing e Project, tudo de graça. Demite Roberto e implementa ele mesmo a solução.

Poderia passar mais um bom tempo aqui falando das peripércias de Joãozinho gerenciando sua empresa quase de graça (como podutos para analisar a concorrência [como o Alexa ou o Quantcast] e muitos outros). É incrível o que conseguimos fazer hoje sem pagar nada - ou quase nada.

Você pode estar se perguntando: "De onde essas empresas ganham dinheiro?". A idéia por trás de tudo isso é a mesma: dar alguma coisa de graça para conseguir (1) ter publicidade, (2) vender outro serviço ou produto, (3) ganhar dinheiro quando o usuário precisar fazer upgrade da versão básica (vemos isso bastante na abordagem do Google) ou (4) vender consultorias em cima dos produtos.

O senhor Gillete já fazia isso há mais de cem anos atrás: às vezes dava de graça ou vendia a preços baixíssimos os barbeadores para gerar demanda para a reposição de lâminas. Um exemplo moderno da Gillete são as impressoras de jato de tinta, que são vendidas abaixo do custo para que se ganhe dinheiro na reposição do cartucho. A HP é líder nessa tática, possuindo às vezes menos de 3ml de tinta no cartucho (cartuchos antigos da empresa possuíam 40ml) e vendendo-os mais caros que os cartuchos com mais de 10ml da Canon (uma das marcas que menos usa essa técnica).

A banda Calypso usa uma forma modificada dessa "metodologia": imprime CDs oficiais e dá a diversos camelôs, por onde quer que passem. A única coisa que pedem em troca (já como os camelôs não pagam nada e ficam com todo o lucro) é oferecer seu CD antes e deixá-lo bem à mostra. O resultado é que a banda ficou famosa - muito famosa. A renda da banda é concentrada em shows e o público, como se poderia esperar, é enorme. Boa parte conhece a banda através do CD oficial que compraram do camelô a um preço baixíssimo.

Só com a renda dos shows, que são um sucesso devido ao grande público que sempre pede a sua volta, já compraram um avião para facilitar as idas e vindas.

Estamos num mundo novo. O modelo de negócio de CD comprado na loja já está falido. Talvez até o de venda na Internet já esteja também. É necessário ser criativo e ver como pode-se atrair o grande público. E a solução de "dar algo de graça" está se tornando 0 novo padrão de marketing, principalmente no mundo on-line.

Dr. Zambol
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