segunda-feira, 19 de maio de 2008

Métricas para o Ano Novo

O clima na companhia já não era lá essas coisas, com os rumores de reestruturação e demissões. Portanto, quando o Diretor de Bolívar chamou uma reunião relâmpago para o fim da tarde da sexta-feira, ele já tinham uma boa idéia do que seria discutido. Na sala, além de Bolívar com o seu mau-humor tradicional, Rubens e Patrícia, os outros dois gerentes que trabalhavam para o mesmo diretor.
Sem mais delongas o Diretor iniciou o assunto:
- Pessoal, como vocês já devem saber, a empresa está passando por um momento de reestruturação. Em consequência disso, nosso departamento vai ser, em parte, terceirizado.
Ainda que soubessem da reestruturação rondando a empresa, a notícia caiu como uma bomba para os três, pois não imaginavam que ela chegaria ao seu quintal. Ouviram impassíveis o resto da explicação.
- Em função disso, preciso que cada um de vocês indique cinco funcionários para demissão. Precisamos reduzir em quinze o nosso departamento até o fim do mês. Vocês têm trinta minutos para pensar e eu volto aqui depois para receber a lista.
Bolívar, conhecido por sua frieza no trato com as pessoas, agora parecia particularmente afetado. Os outros até pensaram em esboçar reação, mas pelo que já conheciam do Diretor a decisão estava tomada.Trabalharam silenciosos até que o Diretor voltou trinta minutos depois.
- Pois bem, chegaram a uma conclusão com relação aos nomes?
Rubens foi o primeiro a falar:
- Aqui estão os meus cinco. Tentei pegar pessoas de projetos diferentes para minimizar o impacto no que estamos executando atualmente.
Patricia falou em seguida:
- Esses são os meus. Tenho algumas pessoas com baixo desempenho. Me dá dó no coração de demiti-los, mas temos que fazer o que é melhor para a empresa.
Finalmente falou Bolívar.
- Aqui estão os meus.
O Diretor olhou a lista de Bolívar e comentou imediatamente:
- Mas aqui só constam quatro nomes.
- Exatamente, não tenho condições de abrir mão de mais ninguém.
Os outros olharam Bolívar, primeiro perplexos e depois com um pouco de indignação, afinal ele estava mudando as regras do jogo.
- Bolívar, vou explicar mais uma vez, preciso de quinze nomes, e cada um de você vai me fornecer cinco.
- Entendi, mas não posso ajudá-lo chefe, mais do que isso é simplesmente inviável. Cortei tudo que podia com esses quatro nomes.
Os outros dois gerentes, que conheciam o time de Bolívar, começaram a fazer sugestões:
- Que tal o Luciano que não está na lista, ou o Roger? Fiquei sabendo que ambos não estão muito bem.
Bolívar estava nitidamente contrariado.
- Já expliquei que é impraticável adicionar mais um nome do meu time. Mas tudo bem, se for para fechar o departamento de vez que tal a gente colocar os dois então? Desse jeito ajudamos ainda mais a empresa. Está aqui chefe, agora você tem seis nomes do meu time.
- Bolívar, você está sendo infantil, eu preciso de cinco.
- Chefe, estou dizendo que não posso demitir cinco pessoas sem comprometer profundamente o trabalho, mas se for para listar mais do que quatro, posso te fornecer seis então, ou oito. Vamos demitir logo as dezesseis pessoas que trabalham para mim.
Perplexo, o Diretor fitou Bolívar por alguns segundos. Não esperava resistência, e mais do que isso, não esperava tamanha paixão pela companhia e por seus funcionários, pelo menos não vindo de alguém como Bolívar.
- Ok Bolívar, entendo e respeito a sua luta pelo time. Vou dizer ao presidente que forneceremos apenas catorze nomes. Ele provavelmente conseguirá mais um de outra área.
Terminada a reunião os colegas vieram falar com ele:
- O deu em você? Discutir com o diretor por causa de apenas um nome? Logo você Bolívar que pouco se importa com o time.
Mas Bolívar deu as costas aos colegas e nada respondeu.
Na empresa, Bolívar já era conhecido por suas estranhas manias, porém, há duas semanas descobriu que havia algo mais por trás de suas neuroses. Havia sido diagnosticado com TOC, Transtorno Obsessivo Compulsivo. Ainda que estivesse numa fase inicial, tratava-se de uma enfermidade grave. Por conta disso suas pequenas manias haviam se tornado verdadeiras obsessões. Dentre elas, a que mais incomodava era o fato de que ele não conseguia, em hipótese alguma, conviver com números ímpares.
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Mais do Bolívar, aquele gerente que todos conhecemos:
[]s
Jack DelaVega