sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

Mamãe, Quero Ter Alto Desempenho - Reedição

Já falamos algumas vezes aqui de Talento x Esforço, geralmente fazendo referência ao Taffarel (o talentoso) a ao Mazaroppi (o esforçado).

No livro Talent is Overrated, de Geoff Colvin, já com tradução para o português sob o título de Desafiando o Talento, o autor exibe uma série de estudos com algumas conclusões bastante interessantes sobre o tema.

O primeiro paradigma que Geoff tenta quebrar é a associação de desempenho com talento. Um estudo de QI realizado com pessoas de alto desempenho mostrou que nesse grupo há pessoas brilhantes, mas também há muitas pessoas com o QI inclusive abaixo da média. Elas são excepcionais em seu ramo – sabem bastante a sua área e por isso conseguem um desempenho histórico tão alto, mas o QI não mede isso de forma alguma.

Diferente do QI, o que saltou aos olhos foi a memória. A maioria das pessoas de alto-desempenho apresenta uma memória muito grande, ajudando-os a reconhecer padrões que deram certo e padrões que fracassaram, auxiliando muito na decisão de qual caminho seguir. É claro que a memória não vem de graça: passaram anos lendo materiais e memorizando muitos dados essenciais para que hoje sejam tão bons no que fazem.

Para mim, que gosto bastante de música, essa noção já era bem clara. Mesmo tendo uma facilidade muito grande para matemática, e sendo o estudo da harmonia extremamente matemático (utilização de escalas pentatônicas, cromáticas, etc), até hoje sou um músico medíocre. As duas únicas músicas que escrevi são tão ruins que tive vergonha de torná-las públicas inclusive para minha esposa. Por quê? Simples. Sem prática, sem repetir exercícios inúmeras vezes, meus dedos, meu ouvido e muito menos meu cérebro não tem uma noção clara do que criar.

Mozart, mesmo tendo nascido com um dom muito grande para música, passou a infância treinando exaustivamente, repetindo milhares de vezes exercícios, sons e escalas. Caso tivesse se interessado por xadrez paralelamente na época, talvez hoje seu nome não seria associado com nada – nem a um músico famoso nem a um enxadrista bom. A chave do sucesso foi o foco que teve na música e, claro, uma boa memória que o fazia lembrar do que combina com o que e padrões que tinha ouvido que se encaixavam bem (afinal, temos apenas 12 notas). O mesmo pode-se dizer de Tiger Woods e Warren Buffet.

O segredo, além do foco e atenção dedicadas a essas atividades, seria o que Geoff chama de Prática Deliberada, que é um método estruturado e objetivo de treinamento. Imagine três círculos concêntricos. O círculo interno chama-se “zona de conforto”, o do meio “zona de aprendizagem” e o mais externo “zona do pânico”. O treinamento deve focar apenas na zona de aprendizagem – é só lá que você consegue melhorar. Exercitar a zona de conforto de nada adianta, pois você já faz bem aquilo. A zona do pânico é tão complexa para você que a aprendizagem é mínima, podendo ter efeitos até danosos.

Isso quer dizer que apenas repetir uma escala milhares de vezes não trará nenhum benefício se (1) você já souber bem aquela escala e (2) se você não souber por que eu está tocando aquilo. A cada repetição, se está na zona de aprendizagem, você irá analisar o que fez de errado e retroalimentar essa informação em sua próxima série de exercício, prestando atenção em cada detalhe.

Para ter sucesso no treinamento, você precisa:

  1. Saber aonde você quer chegar
  2. Praticar focado e utilizar a retroalimentação de suas observações (ou das de seu professor / mentor).
  3. Praticar no trabalho: prepare, avalie e se desenvolva. Use o ciclo PDCA.
  4. Aprofundar no conhecimento: leia sobre o assunto, seja o melhor que você consegue ser naquilo.
Por fim, o livro cita uma coisa muito interessante, dizendo que existem prodígios na música e na matemática, mas você nunca viu e provavelmente nunca verá um prodígio em física quântica e nuclear, simplesmente pelo fato de que uma criança não tem a capacidade de pensar naquilo e, por isso mesmo, não consegue praticar e por conseqüência não consegue nem entender aquilo direito, quem dirá dominar o assunto. Existem certas coisas que só com a idade são adquiridas. Gerência de pessoas, por ser um assunto completamente inexato e baseado em experiências, parece ser outro bom exemplo de uma coisa muito difícil de se encontrar prodígios...

Os ensinamentos do livro, em minha opinião, se aplicam diretamente ao nosso trabalho. Às vezes reclamamos que fomos mal avaliados, mas, no fundo, não fizemos nada de profundo para mudar a situação: não lemos sobre o assunto, não buscamos feedback e não praticamos com objetivo e foco para melhorar cada um dos tópicos identificados como oportunidades de melhoria – enfim, não nos esforçamos tanto quanto poderíamos.

Sem prática e trabalho duro, nem Mozart nem Tiger Woods seriam o que são.

Você não quer ser melhor que eles de graça, né?

Dr. Zambol
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