terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Shu, Ha, Ri

- Dois expressos. Você quer alguma coisa para comer? O cheesecake daqui é uma delícia.
- Não obrigado, só o café mesmo.
Percebi pelo semblante que algo o preocupava.
- E então, como vão as coisas na empresa?
- Mais ou menos, estou um pouco frustrado.
- O que está incomodando você?
- Eu adoro trabalhar lá, já falamos sobre isso. Mas o fato é que às vezes tenho a sensação de que poderíamos ir mais longe, entregar mais, com mais qualidade.
- E...
- E então eu esbarro em pessoas que ficam nos segurando. Burocratas, gente que faz o seu trabalho da mesma maneira por anos a fio, sem mesmo entender o que estão fazendo. 
- Hmm, entendi. Você já ouviu falar de Shu, Ha e Ri?
- Não, do que se trata?
- Essa é a maneira que as artes marciais, Aikido, por exemplo, classificam os níveis de proficiência de um praticante. Em uma tradução livre as palavras querem dizer: Aprender, Desconectar, Transcender. Quando um aluno está em Shu o que ele faz é basicamente imitar os movimentos do instrutor, na maioria das vezes sem entender exatamente o que está fazendo. Em Ha, o segundo estágio, o aprendiz reflete sobre o sentido do movimento que está sendo executado. Nessa fase a técnica é realmente absorvida em sua essência. Ri significa ir além, transcender. Nesse estágio o aluno deixa de ser aprendiz e torna-se um praticante, alguém capaz de criar com base no seu conhecimento e aplicar a arte a novos contextos.
- Acho que entendi, mas o que isso tem a ver com os meus problemas?
- Tudo. Problemas iguais aos seus acontecem todos os dias, nas mais diferentes empresas. Pense em um desses funcionários que você descreveu, um "burrocrata" que atrapalha a vida de todos, cobrando coisas que não fazem sentido. São pessoas que não conseguiram sair estágio de Shu, gente que executa o trabalho sem entender, às vezes, o sentido do que está fazendo. 
- Hmm, entendi.
- Percebe? A pessoa começa a entregar real valor para a empresa quando já está no Ha.
- E o Ri?
- Esses deveriam ser os líderes da organização. Pessoas que conhecem a sua prática tão a fundo que são capazes de levá-la ao próximo nível.
- Mas isso tudo não tem a ver com senioridade profissional?
- Sim e não. Já vi profissionais Sênior que ainda estão em Shu e gente jovem que está bem mais avançada. Na verdade, o que falta mesmo é coaching. Você entende que seu papel como líder é levar sua equipe do Shu, para o Ha, e até ao Ri? Sua responsabilidade é fazer com que eles se tornem profissionais autônomos, capazes de entender o que realmente importa no trabalho. E mais adiante sejam capazes de liderar as mudanças na organização.
- Não havia me dado conta disso, pelo menos não dessa maneira.
- Afinal, você não quer ser mais um formador de burocratas não é?
Ele concordou com a cabeça, tomando mais um gole do cafezinho. 
- Uma delícia esse cheesecake, você devia experimentar.

[]s
Jack DelaVega

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