quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

Corações Endurecidos

Henrique desceu do carro apressado na frente do escritório, mas na correria esqueceu de olhar para a rua antes sair. O mendigo estava prestes a lhe abordar:
- Senhor, senhor...
- Não tenho nada.
- Não, mas o sr.
- Já disse que não tenho nada!
Que falta de respeito, a gente não tem mais paz nessa cidade.
- Não é esmola, são as crianças.
- Que crianças que nada vagabundo! Vai trabalhar rapaz! Já disse que não tenho nada!
- É que as crianças... O cinto está solto...
Henrique olhou novamente para a SUV último ano que a esposa dirigia prestes a sair. No banco de trás as crianças brincavam freneticamente. E, de fato, estavam sem o cinto de segurança. Bateu no vidro e avisou a mulher. Só então voltou o olhar para o mendigo. Desde quando deixou de olhar para aquelas pessoas, deixou de ouví-las? Desde quando fechou o coração para a tristeza do mundo?

Tenho a minha vida, dinheiro, poder. Conquistei isso! Eu mereço! Afinal, comecei praticamente do nada olhe onde estou agora. Mas a mesma voz que bradava forte esses refrões, assoviava timidamente vez por outra:
- Mas você nunca passou fome, não ficou sem um lugar para dormir. Teve acesso à educação, mesmo à escola pública. Teve suporte da família.

Os olhos do mendigo diziam muita coisa, mas, principalmente falavam das suas privações. Seguramente aquele sujeito não havia tido as mesmas oportunidades que Henrique, mas o executivo não tinha coragem de encará-lo. Mesmo despido de todas as coisas que definem a nossa humanidade, comida, abrigo, carinho, o mendigo ainda tinha consideração pelos filhos de um burguesinho engravatado que não se dava ao trabalho de o olhar nos olhos.

Tinha que fazer alguma coisa. Chegou em casa e teve uma conversa séria com a esposa. Meses depois surgia uma pequena fundação, uma semente, cujo objetivo seria mudar a vida de pelo menos uma pessoa por ano.

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Em tempo, dia desses assisti o filme "The Blind Side", que tem o título "Um sonho Possível" em português. O filme conta a história real do jogador de futebol americano Michael Oher, um estudante pobre com todas as chances de se tornar um marginal, mas que acaba se tornando um astro do futebol americano, por conta de uma família rica que o "adotou". Ele reforça a sensação de que milagres são possíveis e que muitas vezes dependem apenas da vontade de cada um de nós.

[]s
Jack DelaVega