quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

O Triste Fim de Eduardo Quaresma

A vida de Eduardo ia de mal a pior. Estava prestes a perder seu emprego. Seu chefe tinha sido bem claro com ele. Mais um deslize e ele estava fora. Deslize esse que tinha acabado de cometer. Tentando rodar um comando no ambiente de teste, tinha por engano executado em produção, apagando todo o histórico de notas fiscais da empresa.

Quando se deu conta disso, deixou a sala correndo e subiu no alto do prédio que sediava a empresa. Eram 32 andares. O vento soprava forte. Estava agora no pára-peito, olhando para baixo, pensando porque sua vida andava tão sem emoção, tão inútil.

Sua esposa tinha lhe deixado há um ano e meio. Ela e seus dois filhos eram apenas uma lembrança distante agora. O motivo da separação foi estresse, parte gerado pelo emprego e parte pela própria forma como estava conduzindo sua vida - sem dar importãncia para nada, sem fazer diferença em lugar algum. De tão envergonhado, nunca mais visitou nem seus filhos. Sentia-se muito culpado por isso.

Olhou para baixo e viu que o caminho era longo. Será que iria desmaiar antes de se espatifar no chão? Será que ia doer? Será que diversas pessoas iriam se aglomerar em volta do seu corpo, curiosos tentando adivinhar o que teria acontecido? Não sabia, mas sabia que queria acabar com aquele sofrimento.

Na empresa, o alvoroço era grande. Os sistemas, devido a falta de informação das notas fiscais ativas, estava completamente trancado. Toda a operação da empresa - uma grande rede de produtos de construção - estava parada. Aquele prédio sediava a operação de Informática da empresa. As 27 filiais da empresa estavam todas inoperantes. O chefe do Eduardo, o seu Assis, estava gritando pelos corredores tentando entender o que havia acontecido.

Eduardo por sua vez começou a chorar. Não sabia o que fazer. Tinha errado boa parte de sua vida. Talvez ao menos quando morresse encontrasse paz nos braços divinos. Talvez encontrasse conforto. O pensamento ao menos lhe trazia um pouco de calma.

Na empresa, já havia se descoberto que o comando havia sido executado por Eduardo - e seu Assis estava à sua procura.

- Cadé aquele filho da puta?

O celular de Eduardo toca. Ele olha para o número no visor do telefone, É seu chefe. Não atende. Não saberia o que falar.

Ele está decidido. Será essa a sua salvação. Inclina-se e, com um impulso forte de sua perna esquerda, atira-se no vazio. Começa a cair. A vertigem é muito forte, uma certa dor de estômago, um medo incontrolável. A queda não é tão emocionante como Eduardo tinha imaginado. Na verdade, estava ainda muito longe do chão e sentia-se enauseado.

Na empresa, as coisas já começavam a voltar ao normal. O DBA havia recém informado que o backup do dia anterior estava sendo restaurado e que as perdas não seriam tão grandes. Mesmo assim, Assis estava irriquieto. pois não encontrava Eduardo e todas o processamento daquele dia tinha sido perdido. Queria tirar satisfações cara-a-cara com aquele verme.

Enquanto caía, Eduardo não conseguia pensar em nada. Aquele romantismo todo que a vida passa como um filme na hora que o sujeito está prestes a morrer não acontecia comele. Só sentia uma forte dor no estômago. Já perto do chão, há uma velocidade extremamente elevada, estava começando a se arrepender do que havia feito. Mas era tarde demais.

PUM

Escuro. Vazio. Nenhum anjo veio buscar Eduardo. Ninguém do inferno também mandou notícias. Não iria renascer em outro corpo ou como um animal. Também não seria um espírito andando pelas ruas da cidade. Nada. Silêncio. A vida havia acabado. Não havia nada após a morte para Eduardo.

Da janela de Assis, ouve-se gritos vindos da calçada. Pela janela observa algo imóvel no chão e pessoas apontando para lá. Olhando melhor, percebe que é um corpo, com uma marca vermelha em volta - parece que é o sangue do sujeito se esvaindo do seu corpo.

- Matilde, acho que alguém se atirou do nosso prédio, vem aqui ver!

Matilde, secretária executiva de Assis, olha pela janela e observa já uma pequena multidão em volta de um corpo.

- Nossa, que horror doutor!
- Bem que podia ser o Eduardo, aquele desgraçado!
- Ai que horror Assis! Naõ fale assim
- Eu sei, eu sei. Pior que provavelmente não é ele mesmo...

Lá embaixo, uma senhora percebe um celular que se encontra há alguns centímetros do corpo vibrar. Por incrível que pareça não havia se quebrado com a queda.

- Olha, está vibrando! Talvez seja a sua esposa. Precisamos avisá-la!

Um senhor pega o celular e o abre. É um SMS. Na mensagem, grifada em letras maiúsculas está escrito.

VOCÊ ESTÁ DEMITIDO. NÃO PRECISA VOLTAR SEU FILHO DA PUTA

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Faça algo de bom com sua vida. Não seja dispensável como Eduardo. Não acabe espatifado no chão, sem chance de viver o resto de sua vida. Faça a diferença nem que seja para uma pessoa, ou sua vida acabará em vão, ninguém ligando a mínima para você.

Comece hoje. Comece agora mesmo no local onde você trabalha.

Dr. Zambol
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