segunda-feira, 25 de agosto de 2008

Os Silva

O Pai do Mauro era Silva, como o filho. Colega na faculdade e sócio na minha primeira empresa, Mauro era um sujeito muito simpático, característica, que fui descobrir mais tarde, herdou do pai. Nossas famílias eram parecidas, nos valores e na classe social. A espremida classe média que sofria nos tempos de inflação com os dessabores dos inúmeros planos econômicos. Mas diferente de meu pai, que se valia de um pequeno comércio para garantir o sustento da família, o Silva era representante de vendas, emprego que garantiu a comida na mesa e a educação dos quatro filhos.

Foi durante o plano Cruzado, que aqueceu a economia brasileira durante alguns meses em 1986, que a classe média viu um esboço de sonho se concretizar. Lembro do meu pai, trocando de carro, a nossa velha Brasília por uma Belina, também usada, é claro, mas bem mais nova. Na família Silva a situação era semelhante, e o pai do Mauro realizou o seu sonho, trocou o Chevette por um Opala, um Opalão quase novinho, com poucos meses de uso. E como na música do Camisa de Vênus a familia inteira celebrou:

"Um dia me pai chegou em casa,
nos idos de 86
E da porta ele gritou orgulhoso,
Agora chegou nossa vez
Eu vou ser o maior, comprei um
Simca Chambord (ou um Opalão)"

Porém a felicidade do Silva não durou muito, por um motivo que ele jamais suspeitaria. Ao chegar nos clientes com o carro novo começou a ouvir comentários:
- E aí Silva, tá ganhando bem ein? Carro novo! Deve estar forrando os bolsos.
Mês a mês ele viu os pedidos minguarem. Os clientes agora evitavam comprar do Silva porque se ele estava com um carro "daqueles" devia estar tirando vantagens nos preços. Além do mais, quem dirige um Opala não deve precisar tanto assim de uma venda. A solução doeu no coração, mas Silva teve que vender o Opala e voltar para o Chevette, esse mais velho ainda que o anterior. E como num passe de mágica a reação nas vendas foi praticamente imediata:
- Aí Sílva, o houve com o Opala?
- Pois é, as vendas estavam fracas, não tive como manter o carro.
- Entra aí então que hoje eu vou te ajudar. Estou precisando de algumas encomendas para repor o estoque.
- Pô Silva, não deu pra manter o carro? Te falei que um carro desses gasta pra caramba. Mas entra aí que tenho que fazer alguns pedidos.

Estou lendo Sway:The Irresistible Pull of Irrational Behavior e lembrei imediatamente da história descrita acima. O livro fala do quanto nossos comportamentos sociais são motivados por fatores irracionais, como raiva ou inveja, nos levando a situações onde preferimos perder, contanto que o outro perca também. Leitura obrigatória para quem gostou do Blink e do Freakonomics.

[]s
Jack DelaVega