quarta-feira, 21 de julho de 2010

Pesadelos

O primeiro foi com um leão. Ele me perseguia por entre os corredores da empresa, saltando por cima de mesas, destruindo tudo ao redor. Eu corria desesperado, procurando alguma coisa que pudesse me salvar. Saía na rua, subia em um muro, mas, justamente nessa hora, ele me alcançava. Acordei gritando, ofegante. Não estava acostumado a ter pesadelos, muito menos tinha idéia de quão frequente eles se tornariam.

Eu enfrentava na empresa um período difícil. As novas metas definidas para a equipe de vendas eram fabulosas, praticamente inatingíveis. Para completar, um sujeito novo veio transferido de outro estado, louco para mostrar serviço. A antipatia foi imediata, ele era uma negação de todos os meus princípios, meu nêmesis perfeito. Em uma sexta-feira o chefe chamou a nós dois:
- Vocês são os melhores vendedores que eu tenho. A empresa está crescendo e surgiu uma posição de gerente regional. Vou ser curto e grosso: Aquele que fizer a maior quota ao final do trimestre fica com a vaga.

Então eles começaram a ficar mais frequentes, tipicamente grandes felinos, tigres, leopardos, mas, não raro, outros predadores, lobos e até ursos. Sempre me perseguindo, sempre no ambiente de trabalho, sempre me alcançando. Comecei a dormir mal, protelar a hora de deitar. Tentei uma taça de vinho antes de ir para cama, na esperança, fútil, de embriagar a fera. Tudo em vão, a cada noite meus predadores vinham com mais sede de sangue.

Faltando pouco para o fechamento das metas ele me encontrou no corredor. O simples sorriso,  demonstrando escárnio, já pedia por um bom soco na cara.
- Então, já pensou como vai ser quando você trabalhar para mim? Porque, convenhamos, é isso que vai acontecer. Estou praticamente batendo a meta e ainda falta um mês para o trimestre acabar. Olha, vou gostar de ouvir você me chamando de chefe.
O pior é que o canalha tinha razão, se ao menos eu estivesse dormindo direito.

O urso polar apareceu de trás da duna, em uma cena digna de Lost. Assim que me avistou começou a correr em minha direção, as garras levantando a areia, a bocarra aberta, já salivando ante a sua próxima refeição. Mas, dessa vez seria diferente, aguardei, imóvel, meu destino inevitável.

Foi também em uma sexta que o chefe nos chamou novamente. Meu colega sorria, antecipando o desfecho. Foi quando o chefe virou para mim e anunciou:
- Parabéns, a vaga é sua! Com o fechamento da conta da GTS você praticamente duplicou sua meta e passou de longe o seu colega.
O cretino me olhava perplexo, ainda sem entender o que havia acontecido.
- Mas, mas? Eu conversei com o pessoal da GTS, eles me disseram que não tinham interesse. Como você reverteu isso?
Não sou de me gabar, mas o sujeito merecia:
- Só fiz exatamente o oposto do que você faria. Mas, não se preocupe, agora como seu chefe eu posso ensinar um ou dois truques para você.

A menos de um metro, a fera saltou em minha direção para o abraço fatal. Então,  o clarão esverdeado do Sabre de Luz brilhou por apenas um segundo. Em seguida o corpo do monstro caía ao chão, o sangue manchando o pêlo branco, enquanto a cabeça rolava para baixo na duna. Foda-se! Se ele estivesse preocupado com a extinção não estaria aqui no meio do deserto. Nem, tampouco, se meteria com um Jedi.