terça-feira, 18 de agosto de 2009

Cultura Corporativa na Netflix

Cultura corporativa é uma coisa muito importante, é o DNA de uma empresa, aquilo que a faz diferente das demais. É a personalidade da organização, a maneira como os líderes da empresa descrevem a visão de futuro; é a soma de valores, costumes, tradições e comportamentos que tornam uma empresa única. Eu sempre fui interessado por empresas que possuem uma cultura corporativa única, pois isso diz muito sobre as pessoas que você vai encontrar lá. Em um tempo onde muitas empresas enfrentam uma crise de identidade cultural, onde várias não conseguem determinar exatamente a cultura corporativa necessária para sair do brete, ou simplesmente onde a maioria nem tem cultura própria - são simplesmente uma cópia do modelo que mais-ou-menos-funciona ali do outro lado da rua - foi com muita simpatia que me deparei com uma apresentação sobre a cultura corporativa da Netflix.

A Netflix afirma que sua cultura corporativa é uma onde são valorizadas a liberdade e a responsabilidade. O que me chocou na apresentação da cultura corporativa deles no entanto foi a simplicidade como foi explicada a razão do foco em liberdade e responsabilidade. A Netflix é uma daquelas empresas que afirma buscar os melhores dentre os melhores talentos, mas possui um racional bastante interessante sobre o porquê dessa busca incessante pela ótima performance. E aí o link se fecha com a idéia de liberdade e responsabilidade. Vou resumir o que a empresa define em sua cultura corporativa a seguir.

O modelo da Netflix envolve dar mais liberdade aos empregados conforme a empresa cresce, ao invés de limitá-la. Esse é um ponto interessante porque a maioria das empresas reduz a liberdade de seus colaboradores conforme a organização cresce - isso acontece para que erros sejam evitados. O racional é o seguinte: conforme uma organização cresce, cresce também a complexidade do negócio. Em paralelo a isso, o crescimento da organização também faz com que novas pessoas sejam contratadas, normalmente reduzindo o percentual de funcionários excepcionais. Com a maior complexidade do negócio, e com um percentual menor de funcionários excepcionais, via de regra o caos se instala. O que surge então? Rá, surgem os processos. Ninguém gosta de processos, mas eles ajudam a controlar o caos. O resultado normalmente é uma empresa de razoável sucesso, orientada a processos, com razoável eficiência, mas com poucos funcionários inovadores, com pouca criatividade e flexibilidade.


E aí o mercado muda...

E de um dia para o outro tem-se uma empresa sólida, com processos definidos, tentando atacar um mercado onde novas tecnologias ou novos competidores ou novos modelos mudaram as regras do jogo. A empresa não consegue se adaptar rapidamente, afinal os funcionários estão acostumados a seguir processos, pois os processos são bons e os protegem do caos... A empresa enfrenta uma enorme dificuldade para responder às mudanças e se recuperar, ou mergulhar no vazio da irrelevância. Humm, me soa familiar...

Enfim, como se evitar esse cenário? Bom, uma maneira fácil é não crescer, correto? Muitas empresas acabam nesse caminho, embora não por opção própria, afinal quem escolheria não crescer. Outra opção é aceitar o caos conforme a empresa cresce, mas manter-se distante de processos engessados. Não soam como boas opções...

Que tal uma quarta opção, na qual o crescimento da organização e da complexidade do negócio seja acompanhado de um crescimento ainda maior do número de funcionários excepcionais? Se você conseguir implantar uma cultura informal, com foco em responsabilidade e em pessoas excepcionais, você é bem capaz de conseguir gerenciar o aumento da complexidade do negócio e ainda assim manter um ambiente que estimule a criatividade e a inovação.

Essa é a proposta da Netflix. E fiquei encantado com a simplicidade com que eles conseguiram comunicar a idéia. "Ah, mas isso é muito complicado de se colocar em prática" dirá um amante dos processos. Pode até ser, mas o que é fácil de se colocar em prática? Porque certamente o cenário descrito anteriormente (o da empresa orientada a processos que se vê perdida em um mercado em mutação) acontece com frequência, e aí sim tem-se em mãos uma mudança difícil de ser gerenciada. Cultura corporativa é uma visão, uma aspiração. As pessoas é que posteriormente comprarão a idéia e farão dela a sua bandeira dentro da organização. O simples fato de uma empresa definir com tal clareza como pensa e porque o seu jeito de pensar diferente tem valor merece todos os meus elogios.

Abaixo a apresentação sobre cultura corporativa da Netflix (em inglês).



Reggie, the Engineer (João Reginatto).
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