quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008

Desenvolvedor no País das Maravilhas

Contam as más línguas que Nerdito era o programador mais técnico da empresa. Dono de uma capacidade absurda de codificação e análise, era mais rápido que todos os seus colegas no setor que trabalhava.

Não era por menos. Aficcionado pela “arte de programar”, saía do trabalho e ia para casa testar as novidades que haviam sido anunciadas no mercado. Passava horas a fio às vezes programando a esmo ou codificando seu próprio site em .NET, que também servia de laboratório para testar todas as novidades do mercado.

Mas Nerdito sentia-se injustiçado. Mesmo dotado de uma capacidade incrível para a resolução de problemas, tinha ficado para trás, pela terceira vez, na escolha da empresa para uma nova vaga para líder de equipe. Nas três vezes viu pessoas, em sua opinião, muito menos capacitadas para assumir tal posição.

Como não gostava de seu gerente, o Arnaldo, por considerá-lo muito fraco e achar que ele não gostava de pessoas técnicas, Nerdito marca uma reunião com seu diretor.

- Fábio, você não me conhece bem, mas sou seu principal desenvolvedor. Sou o Nerdito. Prazer.
- O prazer é todo meu Nerdito. Qual seu nome completo? Pergunta Fábio, o diretor de operações.
- João Sofrenildo Nerdito.
- O Sofrenildo é da mãe?
- Sim. Ela é da familia Sofrenildo. O Nerdito é do meu pai.
- Ok. Lembro-me de você. O Arnaldo já me comentou sobre o seu trabalho.
- Pois é sobre isso mesmo que quero falar. Ele não gosta de pessoas técnicas, talvez porque ameaçem a posição dele. E por três vezes fui passado para trás aqui nessa empresa e assisti pacientemente pessoas menos qualificadas do que eu sendo promovidas ao cargo de líder de equipe, quando ele muito bem sabia que eu era mais capacitado do que todos. Já estou há um dois anos na empresa e sinto-me preparado para essa promoção. Achei que estava na hora de parar com esse joguinho.

Fábio fica extremamente surpreso com aquele comportamento.

- Nerdito. Vamos com calma. O Arnaldo sempre me fala bem de você e sempre foi o maior defensor de sua promoção. E na verdade ele já teve 4 ou 5 reuniões explicando a você onde melhorar correto?
- Correto...
- Pois bem, Nerdito, você quer a verdade nua e crua? São os seus colegas que impedem a sua promoção. E agora fica bem claro para mim as razões. Um pessoa prepotente, que não escuta feedback de seu chefe e se acha melhor do que os outros certamente não pode ser líder. Aliás, porque você nunca procurou o Arnaldo para ter uma conversa franca antes de chegar nessa situação? E saiba mais: o Arnaldo é um gerente técnico – um dos melhores que já tivemos - e que acredita em você, mesmo depois de ver um crescimento comportamental muito lento em você. Nas duas últimas semanas o Arnaldo trabalhou com o seu time atual para prepará-los para ter você como líder nos próximos 6 meses. Ele criou uma nova lista do que você ainda precisa trabalhar e...
- Puxa, eu não sabia disso, me desculpa – interrompeu Nerdito.
- Não precisa se desculpar Nerdito. Vou cancelar esse plano e pedir o seu desligamento da empresa. Infelizmente, você passou dos limites. Já havia informado o Arnaldo sobre isso – ele acreditava em você e eu tinha sérias dúvidas. Agora já não as possuo. Favor passar às 16 horas no RH. Agora preciso resolver um problema urgente com a fábrica de remédios, ok?

Nerdito saiu destruído. Tinha se equivocado terrivelmente – os que havia tratado como inimigos, estavam jogando a seu favor. Aqueles que tinha como amigos, estavam contra ele.

Naquele dia, Nerdito precisou ser demitido para finalmente estar pronto para aprender algumas lições básicas de uma organização:

  • Escute o feedback, acredite e trabalhe em cima dele. Jack DelaVega escreveu um post muito interessante sobre o feedback.

  • Ninguém quer um herói técnico que não tenha inteligência emocional de resolver questões comportamentais. Uma pessoa assim, nem para desenvolvedor serve – ao menos não por muito tempo.

  • Não ponha NUNCA a culpa exclusivamente nos outros. Numa relação, SEMPRE existe uma parcela de culpa nos dois lados. Pode ser que os outros estejam mais errados do que você, ok, mas entenda porque eles ajem dessa forma e trabalhe para mudar.

  • Os maiores advogados e promotores da sua carreira serão sempre o seu chefe e os seus colegas, nessa ordem. Sem o apoio deles, você não tem nada. Já como o feedback do chefe é mais comum, tente entender o que seus colegas pensam de você, nem que você tenha que se expor para conseguir isso, marcando uma reunião com cada um e perguntando a eles quais ações você deveria “Começar”, quais ações você deveria “Parar” e quais ações você deveria “Continuar”. Esse é um modelo de feedback conhecido como Start/Stop/Continue. Eu gosto muito desse modelo pois ele expõe as fortalezas (Continue) e as fraquesas (Start / Stop) de um jeito bem prático e rápido.

E você? Ainda coloca a culpa nos outros?

Dr. Zambol
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Quer conhecer mais histórias de Nerdito? Conheça o texto Suportanto o Suporte.